Embora a Gestalt-terapia seja uma teoria das relações, pouco é definido na literatura sobre os tipos de relações possíveis. Dependência, independência e interdependência são fenômenos que podem ocorrer em diversos contextos. Alguns deles são saudáveis, enquanto outros não. Frequentemente, notamos a expressão “dependência emocional” como não saudável.
Podemos caracterizar uma relação como dependente aquela que um organismo imprescinde de um outro para viver. Quero crer que você, assim como eu, experimentou esta sensação na infância. Dependi dos meus cuidadores para ser nutrida tanto de alimentos quanto de experiências deste mundo. À medida em que cada organismo amadurece e desenvolve autonomia, esta dependência se reduz. No entanto, isso não ocorre do mesmo modo para todo mundo. Alguns aprendem a amarrar os próprios sapatos, mas jamais aprendem a cozinhar sua própria comida. Conhece alguém assim?
Depender de um outro para identificar o que sente
Encontro na clínica, com alguma regularidade, descrições de consulentes que emocionalmente dependem de um outro. Quem não sabe identificar o que sente está mais vulnerável a depender de algum recurso com o potencial de aplacar a angústia. Este recurso pode ser uma relação afetiva, mas também pode ser drogas, jogos ou sexo. Entendo que alguns recursos podem ser mais aceitos socialmente do que outros. Ser viciado em trabalho é altamente aceito em nossa sociedade, por exemplo.
Se um organismo não aprende a identificar e nomear o que sente, entendo que haverá dificuldades em relações afetivas. Relações essas que podem ser de parentesco, de conjugalidade, entre outras. Aqui cabe um parênteses para explicar o fenômeno coletivo de gênero. Estamos em uma coletividade que meninos são socializados para reprimir emoções, enquanto meninas não são. É frequente o relato de mulheres que descrevem a necessidade “gerir emocionalmente a família”, sejam como mães, esposas ou filhas. Arrisco-me aqui com a correlação: será que isso ocorre no caso que você está investigando?
Diferenças entre gêneros
Enquanto investigo um fenômeno descrito como dependência emocional, preciso verificar o contexto social e histórico. Há uma relação de cuidado com o outro? Como esta relação ocorre fenomenologicamente? Há uma necessidade de ser cuidado, mesmo que, teoricamente, seja um organismo maduro o suficiente para tal?
Algumas palavras aparecem frequentemente nestes relatos: manipulação, imaturidade, incompetência, projeção. São palavras que devem ser anotadas e investigadas, mas que podem não ser relevantes ontologicamente.
Faço este alerta para a pessoa Gestalt-terapeuta que lê: não precisa ir muito longe, fique no básico! Investigue como ocorre a interrupção do contato. Tenho observado que, casos mais sensíveis, há confluências e introjeções que precisam de atenção no processo terapêutico.
Talvez eu esteja em uma relação de dependência emocional…
Identificar uma relação como dependente e não saudável é o primeiro passo em um processo terapêutico. A partir daí, segue uma investigação para entender como esta relação se mantém para que possa ser redefinida. O rompimento não é o único caminho possível. O contrato de relação precisa ser redefinido e assinado por todas as partes. Que cada um possa se responsabilizar por sua parte do processo. O processo terapêutico pode ser um espaço para ressignificar vínculos, cultivar autonomia e construir formas de estar com o outro.

Estou com horários disponíveis para atendimentos individuais e para casais, além de outros arranjos afetivo-sexuais. Também estou disponível para supervisão em temas de gênero e sexualidade. Online e presencial em Pindamonhangaba, SP.
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