Tem uma imagem que trabalho na prática psicoterapêutica que é a das “caixinhas”. Reconheço que rotular questões da vida e arquivá-las de acordo é fruto de uma maneira de olhar para o mundo de maneira cartesiana. Ainda assim, é a partir da reflexão desta visão de mundo que é cartesiana que podemos observar os fenômenos.

Através de um assunto, desenvolvo uma consciência sobre significados que atribuo àquela situação, passando para as próximas questões com uma maior consciência. E à medida que o processo terapêutico avança, uma demanda que parece a princípio muito simples, pode avançar e se tornar mais específica, conectada a outras caixinhas ou até mesmo a outras que ainda nem foi possível nomear.

E esse é um dos pontos mais delicados de qualquer terapia, abrir aquelas caixinhas que não tem nome, que nem sempre nos sentimos prontos para abrir. A caixa de Pandora de cada um, algo existencial, rico e diverso quanto a existência humana pode ser. Pode ser de uma angústia não nomeada, de um trauma que perdura ou algo próprio da condição humana, como o que se faz diante da inevitabilidade da morte.

Uma caixa pode levar a outras e a partir de algo que parece desconectado, é possível expandir e olhar para o todo, de maneira consciente, entendendo como a descoberta de hoje faz sentido no contexto do ontem. Até o passo de abrir algo precisa ser um movimento desperto, porque também há uma escolha possível de não trabalhar determinadas questões naquele momento.

Respeite seu tempo

Não há tempo certo ou errado para abrir determinadas caixinhas. Há o que é possível para cada um, de acolher as possibilidades e recursos. As caixinhas passam tanto pelo que dá para olhar agora e sobre ter o que é suficiente para lidar. O importante é que o processo terapêutico ofereça o que é necessário para cada momento, às vezes com um acolhimento, às vezes com uma verdade mais dura, mas sempre buscando a awareness do aqui-e-agora.