Estranhamento

Estranhamento

Um dos objetivos da terapia e, por consequência, do ser terapeuta, é cultivar a flexibilidade no contato. Desejo me aproximar e me afastar de cada objeto a fim de compreender no detalhe e na totalidade. E sempre, sempre, exercitar o estranhamento, por mais que o objeto seja deveras conhecido.

Algo que me agrada na Gestalt-terapia é este exercício de zoom in/zoom out. Ao me aproximar, concentro-me em uma questão específica: uma emoção, um pensamento, uma experiência. Trabalho a partir da descrição do que se apresenta, naquele dado momento, para aquela pessoa consulente diante de mim. Com isso, espero que ela possa exercitar awareness. Ao me afastar, tenho uma compreensão do contexto histórico, social, econômico e político em que o fenômeno ocorre.

Exemplo clínico

Uma demanda comum na clínica hoje, que facilmente posso usar como exemplo, é o “quero emagrecer”. Sinto-me seduzida a ficar fixada no contexto social. Sou solidária! A norma social vigente, até segunda ordem, é “ter um corpo magro”. No entanto, entenda, não posso ficar cristalizada nesta posição. Faço intervenções para entender a experiência desta consulente. Procuro compreender como percebe a exigência coletiva de corpos magros. Depois, avanço para o zoom in. “Para quê emagrecer?”

Estilo e criatividade

Preciso exclarecer: este não é um julgamento sobre a demanda trazida. Fazer as intervenções da ordem do estranhamento podem seguir diversas estratégias. Enquanto terapeuta, eu tenho um estilo de intervenção que se revela na relação terapêutica. Essa relação pode ser nova ou antiga, leve ou densa, mas nunca sem a surpresa da flexibilidade. Tradicionalmente na Gestalt-terapia, convidamos a consulente para experimentar a situação. Algumas das minhas colegas são bem criativas neste aspecto.

Movimentar-se

Encerrar um processo terapêutico, ou mesmo uma reflexão como esta, é sempre provisório. Na clínica, inauguramos um campo de co-construção. Excercitar o estranhamento nos convida, a cada encontro, a desautomatizar a leitura sobre as vivências. Buscamos o novo. Sempre.

Na Gestalt-terapia, a técnica não se separa da relação. É cuidado. É um compromisso com o outro e com sua experiência neste mundo. Seja qual for, seguimos juntas. Ampliamos consciência com criatividade e afeto.

Referências:
JULIANO, J. C. A arte de restaurar histórias. São Paulo: Summus, 1999.



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Simone Villas Bôas Saraiva

Simone Villas Bôas Saraiva

CRP 06/177991
Psicóloga clínica, gestalt-terapeuta, especialista em gênero e sexualidade. Psicoterapeuta com experiência clínica com demandas de estresse, ansiedade e depressão.


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